Entrevista

Entrevista RASHID

A CRISE chegou! E acredito, isso é muito bom! Não, não estamos falando exatamente do problema que mais aflige toda a sociedade brasileira, mas do novo álbum de um dos mais promissores nomes do rap nacional, o paulista Michel Dias Costa, mas que aprendemos a curtir como Rashid.

Nome que surgiu em 2010 com o EP Hora de Acordar, Rashid sempre deu o autêntico papo-reto sobre vários temas delicados que permeiam a sociedade. Antenado com tudo que o cerca, leva o gênero que o consagrou a um novo patamar explorando uma música mais orgânica e se tornando referência quando o assunto é a nova onda do hip hop nacional. Seu novo álbum, CRISE, é feito sob medida para quem busca uma compreensão melhor sobre o atual momento do país.

O Passagem de Som aproveitou a apresentação que Rashid realizou no Auditório Ibirapuera no início do mês para conversar com o rapper, que – como sempre – mandou bem em diversos assuntos e contou mais sobre os bastidores do novo álbum.

Crise é um álbum que reflete um certo pessimismo sobre o país atual?
Rashid: Pessimismo nunca. Sou positivo, mas não ingênuo. Na música a gente caminha por vários climas, então as letras mais pesadas e aparentemente pessimistas surgem também pra fazer um paralelo com as outras. Vou encaixando doses homeopáticas das minhas ideias sobre política e outras coisas, lembrando que não é a verdade universal, mas a minha verdade, minha opinião e visão.

É preciso saber diferenciar isso. Eu não quero converter ninguém ao “Rashidismo”, só quero trazer fatos e ideias à tona e fazer as pessoas pensarem por elas mesmas. Isso traz uma responsabilidade maior até para o dia-a-dia, então eu tento ser transparente.

O Rap e a possibilidade de fazer um trabalho com influências de rock, funk e soul e levar isso para o palco
Rashid: Essas influências fazem parte do meu caminho há muito tempo, mas só agora consegui alcançar uma estrutura musical e artística pra colocar tudo pra fora. Há de se tomar cuidado pra não assustar também. A gente vai temperando.

O Rap vem se preparando pra isso há anos. Faz tempo que os artistas vêm agregando elementos novos nos sons, mas muita gente ainda não dava a devida atenção. Agora é outro momento, os olhares e holofotes também estão no Rap, então o pessoal observa e reconhece tudo isso com mais facilidade.

O nosso trunfo nessa caminhada sempre foi a resiliência… nosso estilo musical consegue transitar por lugares e fases e se comunicar sem deixar de ser Rap. Sem deixar de ser Brasil e sem deixar de ser bom!

O Rap é o novo Punk?
Rashid: Não sei se dá pra dizer que é o “novo alguma coisa”. O Rap tá gritando essas coisas desde os anos 80 aqui no Brasil. Mas é inegável que o momento é ótimo, musicalmente falando.

A importância do disco físico
Rashid: O disco físico hoje é um cartão de visitas. Ainda vende, mas é muito mais difícil. Há 4, 5 anos já era difícil, mas ainda vendíamos. Cheguei a vender 10 mil cópias de forma independente.

Mas veja bem, estou falando do disco físico… um CD pra vender nas lojas, shows, etc. Porque o formato álbum, na minha visão, continua sendo importante no caminho de qualquer artista, por mais que a tendência no momento sejam os singles.

A possibilidade de ser um artista multimídia e o controle do tempo
Rashid: Eu nem sinto esse peso, só o trabalho mesmo. Tudo surge de uma forma muito natural. Tanto as músicas quanto o livro, que era mais um dos meus sonhos.

O livro nasceu da necessidade de trazer à tona as histórias que me fizeram escrever as músicas. Uma coisa é saber o tema, o que o som significa. Outra coisa é você entender o que levou a pessoa a compor aquela letra. Baseado nisso, surgiu meu primeiro livro, que deixa brecha pra mais outros.

O DNA do Rap e a figura do DJ
Rashid: Justamente por essa capacidade de transitar por tanta coisa na música, quando a gente traz outras coisas pro estúdio e pro palco, ao invés de subtrair aquele elemento Rap, aquilo se soma ao Rap.

Nossa música é muita baseada na vivência, então essa substância não se perde. Já o DJ é algo que não fica de fora do Rap. O hip-hop começou com eles e vai seguir assim. DJ e MC têm de ser uma dupla entrosada porque isso faz muita diferença.

A estrutura
Rashid: Não sei dizer se a estrutura para shows hoje melhorou ou eu que comecei a chegar em lugares “melhores” com o crescimento da carreira. Mas a coisa ainda é feia, dependendo do local. Eventos abertos, cidades de interior e eventos na periferia ainda sofrem muita com a falta de estrutura. Já passamos por poucas e boas por aí.

A diferença é gritante pra quando você se apresenta num grande festival ou numa casa grande, tipo o Espaço das Américas. O SESC, por exemplo, sempre se apresenta como um lugar aconchegante pro público e pros artistas, a estrutura é realmente boa. Mas a nível nacional ainda sofremos bastante nos outros lugares com som, palco, luz, etc.

O Rap em tempos de intolerância
Rashid: Nesse momento, quando um artista se posiciona, ele toma pedrada. Isso é triste. Se ele tem uma posição política diferente da do fã, ele vai ser alvo de críticas nas redes sociais. Ninguém quer compreender ninguém e nem respeitar.

Terrível! A gente vai tentando dialogar com calma porque tudo vira briga e meme atualmente.

O futuro com música, literatura e vídeo
Rashid: Vai ser tranquilo, gosto de trabalhar (risos). O livro vai fazer a gente chegar em outros locais e conversar com outras pessoas, isso vai ser lindo. Fora isso, é continuar a tour do CRISE e planejar novos lançamentos.

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Anderson Oliveira

Editor da Revista Som (www.revistasom.com.br) e do Passagem de Som, é formado em Publicidade e Propaganda com pós-graduação em Direção de Arte. Atualmente se aventura pela computação gráfica enquanto luta para completar sua coleção de Frank Zappa.