Artigo

Paralamas e a reinvenção do Acústico MTV

Há duas décadas Os Paralamas lançavam seu terceiro projeto ao vivo, o Acústico MTV, que chegou ao público pouco tempo após os Titãs revolucionarem o formato e redefinirem o protagonismo da MTV na música nacional. A diferença – até hoje – foi a capacidade do trio carioca em transformar um projeto em ritmo de coletânea em algo quase inédito, redefinindo pra sempre seu repertório e canções consolidadas na música brasileira.

Pensar na música brasileira sem pensar nos Paralamas é simplesmente impossível. Pensar em um gênero específico como o rock nacional então… muito menos. Uma coisa parece ter nascido a partir do outra, já que a ascensão de diversos nomes fundamentais para a pavimentação do rock nacional nos anos 80 surgiram via Herbert Vianna. Foram hits e hits, álbuns clássicos e um caminho que acabou resultando em um projeto audacioso no ano de 1999, o Acústico MTV Paralamas do Sucesso. Um evento que mudaria pra sempre a concepção do formato desplugado, que dá vida ao programa.

Esqueça o formato “voz e violão” tão marcante nos anos anteriores, a orquestra que acompanhou os Titãs ou então o aquela ideia de banda que precisa de uma boia da salvação para voltar ao topo. Estamos falando de Paralamas, uma das bandas de maior sucesso na história da música brasileira. Não era pra ser normal e realmente não foi.

Lançado na esteira do álbum Hey Na Na (1998), disco que trouxe ao menos dois hits absolutos para a carreira da banda (“O amor não sabe esperar” e “Ela disse adeus”), um projeto acústico era o que menos precisava o Paralamas naquele momento, mas a oportunidade era única. Na época a MTV vivia seu auge de popularidade, finalmente redefinindo a estética da música pop brasileira, e seus dois últimos projetos acústicos haviam atingido números expressivos com Titãs e Rita Lee. Ironicamente, o acústico de Gal Costa, que foi lançado na mesma época, teria boa vendagem, mas pouco seria lembrado nos anos seguintes. Dessa forma era a vez dos Paralamas.

Gravado no auditório da Escola de Artes Visuais do Parque Lage, no Rio de Janeiro, nos dias 5 e 6 de Junho de 1999, o Acústico MTV Paralamas do Sucesso trouxe uma gama de novidades que o diferenciava em muito de seus antecessores, começando pelo próprio repertório, composto por faixas menos conhecidas da banda e por covers ousados como o de Manguetown, de Chico Science & Nação Zumbi, e Que País É Esse?, da Legião Urbana. Porém, o que mais chamou a atenção, em sombra de dúvidas, era a formação levada ao palco para a gravação.

Não se tratava mais de um trio, mas praticamente de uma big band. Acompanhado do sempre espetacular João Fera (piano), esse Paralamas do Acústico MTV ainda contava com Eduardo Lyra (percussão), Monteiro Júnior (sax), Demétrio Bezerra (trompete) e Bidu Cordeiro (trombone), além de Dado Villa Lobos (Legião Urbana). Um grupo vestido de vermelho e que garantiu uma intensidade única ao disco.

Em entrevista ao jornal Folha de SP, à época do lançamento do disco, Herbert Vianna sabia onde tinha enfiado o pé. “Estamos conscientes do risco comercial de deixar de fora praticamente todos os hits, mas queremos tocar outras coisas”, afirmava.

Não foi exatamente dessa forma, afinal, faixas como Meu Erro (que teve Zizi Possi dividindo os vocais com Herbert, além de um arranjo em bossa-nova), Caleidoscópio e Tendo a Lua estavam lá, mas perto da avalanche de hits já produzidos pela banda, era pouco. Formado em sua maioria por faixas como O Trem da Juventude e Navegar Impreciso, o longo acústico, de mais de 20 faixas, se destacou exclusivamente por suas novidades. E não eram poucas ou menos intensas.

Para se ter uma ideia hoje, duas décadas depois, algumas novidades do Acústico MTV permeiam o setlist da banda ao vivo. O cover de Que País é Esse? ou Manguetown são bons exemplos disso. Havia outro cover, Feira Moderna, de Beto Guedes, Fernando Brant e Lô Borges, escolhida puramente por motivos sentimentais, conforme afirmaria posteriormente Herbert Vianna.

Com duas faixas inéditas, uma delas Um Amor, Um Lugar, composta por Herbert e gravada até então somente por Fernanda Abreu, e Sincero Breu, parceria com Pedro Luís, do grupo Pedro Luís e a Parede, o disco ficou marcado uma intensidade que em pouco lembrava o formato acústico, mas os já impressionantes shows do Paralamas no formato elétrico. Não a toa, o próprio guitarrista empunhou uma guitarra, garantindo ainda mais intensidade na gravação.

Com referências que iam de James Brown a Talking Heads, o projeto foi um sucesso. Ao vender 400 mil cópias, 100 mil a menos que o maior acústico da história da emissora, dos Titãs, os Paralamas lançavam um formato que passava longe do clima intimista já tradicional, nascia ali um show pronto para embalar qualquer festa, exatamente como suas apresentações até então.

O legado do Acústico MTV Paralamas do Sucesso é fácil de se medir. Mais adiante, Marcelo D2, Charlie Brown Jr e Cidade Negra foram bons exemplos de como o formato evoluiu a partir do trio carioca. Pautados pelo clima intimista, os Acústicos lançados pela MTV posteriormente se tornariam uma verdadeira caixinha de surpresas, invariavelmente ao estilo.

Há quem diga que esse ou aquele foi melhor, mas todo acústico hoje é imprevisível, não a toa Tiago Iorc foi o escolhido para retomar esse tipo de programa, mas uma coisa é certa. Depois dos Paralamas tornou-se simplesmente impossível prever como será o próximo projeto.

About the author

Avatar

Anderson Oliveira

Editor da Revista Som (www.revistasom.com.br) e do Passagem de Som, é formado em Publicidade e Propaganda com pós-graduação em Direção de Arte. Atualmente se aventura pela computação gráfica enquanto luta para completar sua coleção de Frank Zappa.