Entrevista

Entrevista MONSTRO

O Monstro está livre. O Monstro está solto. Mas ninguém precisa temer o monstro. Pseudônimo de Leo Barbalho, criativo cantor e compositor pernambucano, Monstro divulga agora seu novo álbum, o ótimo Solar. Um disco que pode ser definido como uma transposição de experiências tão intensa que nasceu há dois anos e só agora vê a luz do dia.

Projeto que nasceu de um celular, Solar é um disco que em qualquer outra situação poderia ser chamado de artificial, não fosse a capacidade criativa de Leo, um verdadeiro Monstro multimídia.

Nesse embalo Monstro saiu da toca e conversou com o Passagem de Som em uma grande entrevista. Conheça sua música. Conheça o Monstro!

A vida de um pernambucano em SP e o quanto isso influenciou o disco
Monstro: Cheguei em São Paulo em 1998, com 19 anos. Este ano completei 19 anos de São Paulo, ou seja, metade da minha vida lá e metade cá. Já não consigo mais diferenciar o que de mim é Recife e o que é São Paulo, costumo a dizer que sou “pernambulista” (risos).

A vivência em São Paulo está diretamente ligada com o álbum e com tudo que produzo, pois sou influenciado por tudo que me cerca. O álbum não teria existido sem os shows que fiz, as pessoas que conheci, as experiências que tive. O processo de concepção do álbum surgiu durante as gravações do Pantim, álbum de 2013 de Lulina, quando ela decidiu fazer aulas de canto para gravar as vozes. Eu a acompanhei nas aulas, foi aí que conheci Sandra Ximenez (Sandra X), que foi uma das peças fundamentais no processo todo, pois foi durante as aulas com ela que fui “descobrindo” uma voz que não sabia que tinha e começando a explorar outras áreas da minha voz. Já nos shows do Pantim, conheci o Pedro Penna (3 Cruzeiros), que foi quem topou produzir o álbum comigo. Então sem minha vivência nos palcos e na cena musical, o Solar não existiria.

Um Monstro multimídia
Monstro: Eu sou um artista multimídia por formação, me graduei em Artes Plásticas e meu projeto, na época, envolvia música, vídeo e fotografia. Durante anos atuei como fotógrafo e editor de vídeos. Acho de extrema importância, nos dias hoje, os artistas serem multifacetados. Na música o visual se tornou quase tão importante quanto o som em si. Sinto que o público precisa de outro estímulo, que não o sonoro, para prestar atenção em algo, já que temos um excesso de informação circulando no nosso dia a dia. E a imagem é algo que impacta diretamente (negativa ou positivamente).

O papel do disco físico
Monstro: O disco físico, hoje, é quase um objeto colecionável. Por isso tenho visto vários artistas desistirem do CD (que está quase em desuso) e lançarem os álbuns digitalmente e, posteriormente, em vinil. O digital veio para facilitar e dificultar a vida de um artista. Facilitou porque hoje qualquer um pode compor, produzir, se expressar. Dificultou, pois, exatamente por todos poderem compor e produzir livremente, aumentou muito o número de pessoas fazendo aquilo, ficou mais difícil de conseguir se destacar em meio a tanta produção. Acho que o digital veio pra mudar o modus operandi, não para mudar a concepção de música pra o artista. A música continua sendo uma expressão livre.

A importância do eixo RJ-SP para os artistas
Monstro: A globalização facilitou o aparecimento de pequenas cenas locais, que, na verdade, sempre estiveram lá, mas não tinham como atingir pessoas que estivessem mais distantes. Agora posso ter minha banda no quartinho dos fundos da minha casa, colocar meus vídeos ou músicas na Internet e amanhã estar fazendo um show em algum Teatro ou Festival grande, seja em São Paulo, Brasília ou qualquer outra cidade. O eixo RJ-SP continua sendo o principal para se trabalhar, pois o circuito é maior que nas demais cidades brasileiras, há mais lugares e oportunidades para shows, mesmo que estes sejam menores e feitos de forma mais independente. Existem festivais importantes como o Abril Pro Rock e Coquetel Molotov (em Recife), Bananada (em Goiânia), Se Rasgum (Belém), Fora da Casinha (SP), todos excelentes e cada vez ficando maiores, mas ainda são muito pontuais, pois acontecem em épocas específicas do ano.

A escolha do nome artístico
Monstro: Eu já era apresentado por Lulina, nos shows, como Leo “O Monstro” e já era conhecido assim. Então resolvi tirar meu nome e deixar só o Monstro, que me dava uma impressão mais geral de artista, não de uma pessoa específica. Pode ser uma pessoa, uma banda, um coletivo, um projeto… isso me permite, de fato, mais liberdade para criar e experimentar. No caso específico do álbum Solar, eu trabalhei as músicas individualmente, respeitando o sentimento e o espaço que elas pediam, não fui pensando num resultado final. Ele apareceu para mim da primeira vez que ouvi as 10 músicas juntas, foi como um filho mesmo, à moda antiga: não quis fazer o exame para saber o sexo, risos.

O álbum Solar no palco
Monstro: Transformar o álbum em show foi um desafio para mim, pois criei as músicas praticamente sozinho, em meu celular e computador. Depois de ter as 10 músicas pré-produzidas, pedi ajuda ao Pedro Penna e fomos substituindo muitos elementos que criei com samples, loops e teclados, por instrumentos tocados. Depois que terminamos percebi que tinha um álbum cheio de camadas, com eletrônicos, guitarras, cordas, sopros… e como fazer isso ao vivo? Se fosse fazer completo teria que ser uma big band de umas 8-9 pessoas. Acho que isso foi o que fez com que eu levasse 6 meses entre o lançamento digital do álbum e o primeiro show. Resolvi dar um reset e fazer o show com uma formação diferente da que gravou o álbum e reformatar as músicas (respeitando as intenções das originais do álbum) com menos músicos. No show me acompanham Bianca Predieri (beats), Tomaz Magalhães (guitarra) e Katu (baixo, sintetizador, flauta e trompete).

A identidade de Solar e a natureza da música pop
Monstro: Não acho que esteja indo na contramão da estética pop, acho que a estética pop é muito flexível, pode-se experimentar muito com ela. Ser pop não significa ser óbvio, na minha concepção. Eu vejo a Björk, por exemplo, como uma artista pop. Ela experimenta, distorce o conceito do pop, mas, ainda assim, faz música pra todos, música popular, universal. Acredito que isso é ser pop. Brian Eno e Duprat são duas grandes influências pra mim, dois artistas que ouço sempre, há décadas, e ainda assim me arrepio quando ouço, me emocionam.

Acho que essa “garimpagem” por música sempre houve, mas acredito que, com o advento digital, as pessoas estejam com mais facilidade para procurar por coisas legais em fanpages, blogs, sites independentes de música, comunidades. Os serviços digitais de streaming ajudam muito também, ao “entender” qual seu gosto musical e fazer aquelas listas com sugestão de novos artistas/bandas pelos quais você iria se interessar.

A relação dos grandes veículos com o underground
Monstro: Existe um abismo e ele é imenso. Lugares alternativos para música estão se tornando, cada vez mais, lugares de resistência. A cultura no nosso país está cada vez mais abandonada, deixada de lado. A grande mídia só se interessa em veicular as músicas daqueles artistas que já estão nas paradas de sucesso, pois a única coisa que querem é aumentar audiência dos seus programas e lucrar com isso – quase não há mais espaço para artistas iniciantes ou pequenos. Grandes festivais preferem pagar cachês astronômicos pra uma grande atração, ao invés de investir a mesma quantia para fazer 10, 20 shows com atrações menores.

Um monstro à solta
Monstro: Agora que a minha toca foi aberta e eu deixei o sol entrar, esperem me ver e ouvir bem mais. Já tenho novas composições e novos projetos em vista, esperando pra ver a luz do dia.

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Anderson Oliveira

Editor da Revista Som (www.revistasom.com.br) e do Passagem de Som, é formado em Publicidade e Propaganda com pós-graduação em Direção de Arte. Atualmente se aventura pela computação gráfica enquanto luta para completar sua coleção de Frank Zappa.