Artigo

Rory Gallagher nas páginas policiais

Um dos maiores guitarristas da rica história musical da Irlanda, Rory Gallagher perdeu a vida cedo, aos 47 anos, vítima de complicações após um transplante de fígado em 1995.

Sempre vestido com uma camisa de flanela xadrez e em posse de sua surrada guitarra Stratocaster, Rory não demorou para ser considerado o “guitarrista do povo” pelo público. Visto até hoje como uma espécie de “Bruce Springsteen irlandês”, o guitarrista nunca economizou em suas performances, realizando apresentações antológicas em alguns dos maiores festivais europeus.

A morte de Rory Gallagher interrompeu uma trajetória fascinante, mas seu legado ainda rende uma gama considerável de lançamentos póstumos. Com todo material supervisionado pela Eagle Records, reedições de álbuns clássicos e gravações inéditas abrilhantam ainda mais seu trabalho, que bebia profundamente do blues, do folk e do R&B, mas que o inseria como um grande ícone do rock irlandês.

Um dos lançamentos mais curiosos da carreira de Rory nasceu de uma de suas maiores paixões, os romances policiais. Com composições que permeiam o tema, foi lançado em 2013 a interessante compilação Kickback City, que levou alguns de seus maiores clássicos para dentro de uma história chamada The Lie Factory, que foi idealizada e roteirizada pelo fã e escritor romancista Ian Rankin.

Kickback City não respeita nenhuma ordem cronológica nas faixas escolhidas, mas funciona com uma boa trilha sonora, explorando tanto composições emblemáticas da carreira de Rory Gallagher, caso de In Your Town, do álbum Deuce (1971), como a ótima Continental Op, do ignorado Defender (1985).

Dividida em dois CDs, sendo um em estúdio e outro com algumas gravações ao vivo, o box ganha todo um charme ao incluir um terceiro disco que traz a íntegra do romance sendo narrado pelo próprio Ian, proporcionando uma experiência bastante interessante. Além disso, o romance policial surge amparado pelos traços pelo renomado artista gráfico Timothy Truman, especialista nesse tipo de trabalho.

Do blues cru ao mais intenso hard rock, Kickback City é frenético do início ao fim e sua narrativa consegue transportar o clima noir das faixas de Rory para o enredo, cheio de perseguições em meio a uma clima caótico, tão explosivo quanto sua música.

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Essencial muito mais para os fãs de longa data, Kickback City não é uma compilação comum e não obedece nenhuma lógica na carreira de Rory Gallagher, porém sua maior intenção não é essa. Considerado até hoje um dos mais subestimados guitarristas da história, o guitarrista irlandês tem parte de sua obra revista nesse trabalho por um olhar diferente, mais profundo e que explora suas composições, revelando mais de sua personalidade em meio a um apanhado de faixas que servem de pano de fundo para uma história policial.

Influência de grandes nomes da história como Slash, Johnny Marr e Brian May, Rory Gallagher era apaixonado pelas turnês e não construiu uma família para que pudesse ver sua história seguir em frente de uma forma mais sólida.

Quase duas décadas depois de ter ido executar seus riffs no andar de cima, fãs, amigos e sua própria gravadora ainda mostram que seu ciclo por aqui não foi encerrado e é nas páginas policiais que um novo público pode começar a conhecer o seu incrível trabalho.

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Anderson Oliveira

Editor da Revista Som (www.revistasom.com.br) e do Passagem de Som, é formado em Publicidade e Propaganda com pós-graduação em Direção de Arte. Atualmente se aventura pela computação gráfica enquanto luta para completar sua coleção de Frank Zappa.