Quem procura no Google Images por Tom Moulton certamente se confunde entre a figura esbelta da década de 60 e um senhor atrás das mesas de som nos estúdios da Scepter Records. Hoje com 76 anos, pouco se sabe sobre a história do americano que redefiniu o showbusiness quando criou durante a década de 70 o primeiro remix de um artista.
Tom Moulton nasceu em 1940 e já aos 15 anos começou a se envolver com o mundo da música. Sem envolvimento com nenhum instrumento, trabalhava como comprador em uma empresa de jukebox chamada Seeburg. A ousadia na profissão acabaram por conduzir Tom para outras gravadoras maiores como a King e, posteriormente, a RCA, mas o formato de trabalho acabou fazendo com que desistisse desse nicho, partindo então para um novo desafio profissional.
Nascido na pequena cidade de Schenectady, em Nova York, Tom ganhou diversos conhecimentos técnicos ao longo do período em que trabalhou como comprador, transformando-se em modelador de som. Em uma de suas aventuras, acabou visitando um resort no sul da cidade, em Long Island, onde ficou fascinando com a vibração das festas gays embaladas por soul music no início da década de 70.
Ao perceber que o DJ se mostrava incapaz de manter o público na pista durante um longo período devido aos cortes abruptos no som, decidiu partir para uma nova empreitada pessoal que acabaria por revolucionar o mundo da música. Disposto a abandonar o formato “passo-a-passo” onde uma música se iniciava após o encerramento da outra, fez uso de sua influência para ter acesso à algumas das gravações originais da época na Scepter Records, onde passou a manipular seu conteúdo.
Ao melhor estilo “alquimista”, passou a trabalhar as bases de faixas de 3 minutos para que as mesmas não se encerrassem abruptamente enquanto fizessem a transição para a música seguinte. A faixa escolhida foi Dream World, lançada como single na época por Don Downing e que ganhou uma base extendida, isso facilitava a transição para outra faixa e garantia uma virada de música mais tranquila. Nascia ali o primeiro remix da história.
Demonstrando cada vez mais habilidade na criação de remixes, Tom Moulton ganhou fama após a divulgação de trabalhos como o realizado em Do It, do B.T. Express, e Your Love, do Moment of Truth, o que lhe rendeu respaldo e o transformou em um colunista da Billboard, onde falava sobre a cena disco da época.
Posteriormente, Tom viu sua representatividade crescer de forma definitiva ao criar o primeiro medley em um lançamento oficial. Com nada menos que Never Can Say Goodbye, de Gloria Gaynor, deu ao mundo da música a chance de ter em suas mãos algo totalmente novo.
Ao adicionar à faixa de Gloria Gaynor nomes como South Shore Commission e BT Express, transformou o medley em um sucesso estrondoso, abrindo de vez o mercado para esse tipo de produção.
Conhecidos como “discos de 12 polegadas”, artistas como Grace Jones passaram a lançar versões adicionais de seus álbuns onde era possível conferir seus hits em versões estendidas. Esse tipo de formato garantia o sucesso nas pistas na noite de Nova York, que conferia in loco o surgimento da cena House Music na virada da década.
Tom Moulton trabalhou como remixer até o fim dos anos 70 pela Scepter Records, mas realizou diversos trabalhos por gravadoras como Casablanca ou a Loose Change, garantindo sua assinatura durante o nascimento de diversas cenas que o precederam e sendo considerado um dos maiores engenheiros de produção da história.
Nisso vai destacar também a genialidade de nomes como Larry Levan, primordial ao agregar novas habilidades à figura do DJ. Explorando o uso sintetizadores e efeitos, rompeu a barreira que separava a criação da música e a sua execução nas festas de todo o mundo.
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Em um mundo onde a EDM domina praticamente todas as esferas da música, pensar em remix hoje parece simples para qualquer artista e avessa para grande parte do público, que não vê com bons olhos essa associação do rock ou do jazz com um elemento “eletrônico”. Por outro lado não faltam exemplos de grupos de rock que lançaram (e ainda lançam) faixas manipuladas em estúdio nos famosos formatos de 12”. Rolling Stones e U2 que o digam.
Para se ter uma ideia, os Rolling Stones chegaram a lançar um álbum intitulado The Versions com alguns clássicos gravados na década de 80 em versões estendidas. Miss You, que na gravação original mal chega aos 5 minutos, ganhou uma versão onde sua base de baixo é construída como uma grande jam e praticamente dobra seu tamanho. Já a banda irlandesa viu clássicos de sua fase punk de início de carreira ganharem versões estendidas em discos de 12” que até hoje são procurados por fãs aos quatro cantos.
Somado a isso, percebe-se uma necessidade em ganhar um mercado ainda maior com faixas que não se adequam ao público nativo na época de seu lançamento. The Mamas and the Papas e Pink Floyd, por exemplo, viram sua música chegar ao topo de charts na virada do século com versões que arrebataram um público jovem. E é certo que dificilmente esses novos fãs sentariam para ouvir as gravações originais de faixas como Another Brick on the Wall ou California Dreamin’.
Em 2006 a gravadora Soul Jazz chegou a lançar uma compilação com alguns dos primeiros remixes de Tom Moulton, revivendo alguns dos trabalhos que se tornaram seminais para a história desse tipo de produção. Já em 2012 a homenagem definitiva veio com Philadelphia International Classics: The Tom Moulton Remixes, lançada pela Harmless em quatro LP’s. Além disso, Tom também está no Dance Hall of Fame como o inventor do disco 12″ e reverenciado como um dos mais importantes produtores da história.
Visto isso, fica fácil associar o pop atual com a cada vez mais frequente presença de remixes. Com um trabalho artesanal, Tom Moulton mudou a história da música sem violar o que ela sempre teve de mais sagrado, a essência.
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